quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Cunha embolsou US$ 40 milhões de "pixuleco"

Até a igreja que ele frequenta foi usada para lavar a propina, segundo o procurador-geral 

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou na quinta-feira (20) ao Supremo Tribunal Federal (STF) denúncia contra o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), por receber US$ 40 milhões (quarenta milhões de dólares) de propina nos contratos da Petrobrás com a Samsung Heavy Industries, da Coreia, para fornecimento de navios-sondas para a estatal. Segundo o procurador, que pediu a condenação do deputado a mais de cento e oitenta e quatro anos de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, até uma igreja da Assembléia de Deus foi utilizada pelo deputado para lavar dinheiro desviado da Petrobrás. 

Também foram alvos de denúncia a ex-deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), aliada de Cunha e atual prefeita de Rio Bonito (RJ), acusada de ter participado, a mando do deputado, de manobras de chantagem contra as empresas para o pagamento das propinas. 

Na denúncia contra Eduardo Cunha a PGR pede que sejam devolvidos US$ 80 milhões [R$ 284,20, ao câmbio atual] – US$ 40 milhões como restituição de valores desviados e mais US$ 40 milhões por reparação de danos. Segundo a Procuradoria, a quantia paga pela Samsung foi depositada no exterior, em contas indicadas pelo lobista Fernando Baiano, apontado como operador do PMDB no esquema de corrupção e preso na Operação Lava Jato. A PGR informa na denúncia que identificou 60 operações de lavagem de dinheiro, entre as quais remessas ao exterior, entrega de dinheiro vivo, simulação de contratos de consultoria, emissão de notas frias e transferências para uma igreja da Assembléia de Deus de Campinas, vinculada a Cunha, a a pretexto de doações religiosas. 

OPERADOR 

Segundo consta na denúncia da Procuradoria-Geral da República, o operador do PMDB, Fernando Soares, orientou Júlio Camargo, que prestava serviços para a empresa Toyo Setal, a efetuar dois depósitos num total de 250 mil reais para a igreja da Assembléia de Deus Madureira, de Campinas. Os dois depósitos na referida igreja foram efetivamente feitos no valor de 125 mil reais em 31 de agosto de 2012 pelas empresas Treviso e Piemonte, pertencentes a Camargo. De acordo com o procurador-geral, "é notória a vinculação de Eduardo Cunha com a igreja mencionada. O diretor da igreja perante a Receita Federal é Samuel Cássio Ferreira, irmão de Abner Ferreira, pastor da Igreja Assembléia de Deus de Madureira, no Rio de Janeiro, freqüentada por Eduardo Cunha. Foi nela, inclusive, que o deputado celebrou a eleição para a presidência da Câmara dos Deputados, conforme divulgado pela imprensa. 

A investigação sobre as atividades criminosas de Cunha começou a partir de depoimento, prestado em acordo de colaboração com a Justiça pelo doleiro Alberto Youssef em outubro de 2014 à Lava Jato. Segundo Youssef, o operador da Samsung Heavy Industries e de uma empresa associada, a Mitsui, Júlio Camargo, pagou propina a Cunha a partir do fechamento de contratos da empresa com a Petrobrás. Foram assinados dois contratos para fornecimentos dos navios-sonda Petrobras 10.000 e Vitória 10.000, com a anuência do então diretor da área internacional da petroleira, Nestor Cerveró. Os dois contratos custaram aos cofres da Petrobrás US$ 1,2 bilhão. 

Segundo Youssef, a propina foi paga por Camargo a Fernando Soares por meio de remessas ao exterior. De acordo com a denúncia do procurador, no período de 2006 a outubro de 2012, a contratação do navio-sonda Petrobras 10.000 gerou o pagamento de propina no valor de US$ 15 milhões. No segundo navio, o Vitória 10.000, a propina paga foi de US$ 25 milhões. Youssef contou que em determinado momento os pagamentos da Samsung a Camargo cessaram, o que impediu o operador de continuar pagando Baiano. Ele também disse que, para pressionar Camargo a retomar os pagamentos, Cunha então apresentou, por meio de outros parlamentares do PMDB, requerimentos na Câmara para pedir investigações do TCU e do Ministério de Minas e Energia sobre Camargo e a empresa Mitsui, parceria da Samsung no negócio dos navios-sondas. Os registros da Câmara indicaram que a deputada Solange Almeida de fato apresentou requerimentos no sentido de se ouvir Camargo e as empresas. O peemedebista teria dito ainda a Camargo que era preciso não só resolver o problema dele, Cunha, como também a parcela que deveria ser entregue a Baiano. 

Preso na Operação Lava Jato, Júlio Camargo também fechou um acordo de colaboração premiada com a Justiça, porém a princípio não confirmou a propina a Eduardo Cunha. A versão mudou por volta de março deste ano, quando, em novos depoimentos, Camargo confirmou a história narrada por Youssef. Um processo tramita no Paraná sobre o mesmo assunto, mas tendo por foco o ex-diretor da área internacional da Petrobrás, Nestor Cerveró. Ao ser ouvido pelo juiz Sergio Moro em audiência naquele processo, Camargo confirmou ter pago a propina a Cunha. 

Segundo Camargo, Cunha disse a ele durante um encontro, em 18 de setembro de 2011, acertado por Baiano no escritório da empresa Leblon Empresarial, na Av. Afrânio de Melo Franco, na Zona Sul do Rio, que "o problema que eu tenho é com o Fernando [Soares] e não com você. Acontece que Fernando não me paga porque diz que você não o paga. Como o Fernando não tem capacidade de me pagar, eu preciso que você me pague", disse Cunha. "Não é nada pessoal contra o senhor", prosseguiu. "[Mas] há um débito com o Fernando no qual eu tenho que receber US$ 5 milhões desse pacote referente às sondas". "Isso está atrapalhando porque estamos em véspera de campanha e eu tenho uma série de compromissos". Depois dessa conversa, Camargo disse que pagou os US$ 5 milhões exigidos por Cunha e voltou a pagar regularmente a propina, por meio de repasses a empresas controladas por Baiano no exterior. 

MEDO 

Essa segunda fase de repasses, segundo Camargo, está relacionada às cobranças de Eduardo Cunha. A investigação da Lava Jato demonstrou que Baiano era o controlador das contas abertas em nome das firmas offshore Three Lions Energy, mantida no banco Leu, em Genebra, da Falcon Equity, na Suíça, e da 3 Lions Heavy Industries em Hong Kong. Em suas alegações finais no processo, Camargo disse que pagou Cunha "sob ameaças". Ele disse também que não tinha revelado esses fatos antes por medo do deputado. 

O procurador denunciou ainda, no mesmo dia, o senador Fernando Collor de Melo (PTB-AL), integrante da base aliada de Dilma, por envolvimento em outro esquema de propina, desta vez na BR Distribuidora. Ele é acusado de receber R$ 26 milhões de propina. Completam a lista dos denunciados pelo procurador, Pedro Paulo Leoni Ramos, notório ex-ministro do governo Collor, e mais três pessoas ligadas ao senador. 
SÉRGIO CRUZ

0 comentários:

Postar um comentário